sábado, 8 de dezembro de 2018

UMBANDA

UMBANDA

A Umbanda é até ao momento, a única religião criada no Brasil, foi fundada em 1917 na cidade de Niterói. A umbanda é uma junção de elementos africanos (orixás e culto aos antepassados), indígenas (culto aos antepassados e elementos da natureza), Catolicismo (o europeu, que trouxe o cristianismo e seus santos que foram sincretizados pelos Negros Africanos), Espiritismo (fundamentos espíritas, reencarnação, lei do “karma”, progresso espiritual, etc).
A Umbanda adota para seus Orixás cores diferentes das utilizadas no Candomblé.


CULTO-UMBANDA:

A umbanda tem como lugar de culto o templo, terreiro ou Centro, que é o local onde os Umbandistas se encontram para realização do culto aos orixás e dos seus guias.
O chefe do culto no Centro é o pai ou mãe de santo. São os médiuns mais experientes e com maior conhecimento, normalmente fundadores do terreiro. São quem coordenam os cultos e que irão incorporar o guia-chefe, que comandará a espiritualidade e a materialidade durante os trabalhos.

Como é uma religião espiritualista, a ligação entre os encarnados e os desencarnados se faz por meio dos médiuns.

Na umbanda existem várias classes de médiuns, de acordo com o tipo de mediunidade.

Normalmente há os médiuns de incorporação, que irão “emprestar” seus corpos para os guias e para os orixás.

Há também os atabaqueiros, que transmitem a vibração da espiritualidade superior, por via dos atabaques, criando um campo energético favorável à atração de determinados espíritos, sendo muitas vezes responsáveis pela harmonia do culto.
Há os “Corimbas”, que são os que comandam os cânticos e as “Cambonas” que são encarregadas de atender as entidades, provisionando todo o material necessário para a realização dos trabalhos.

Embora caiba ao sacerdote ou à sacerdotisa responsável o comando vibratório do rito, grande importância é dada à cooperação, ao trabalho coletivo de toda a corrente mediúnica.

Segundo a umbanda, as entidades que são incorporadas pelos médiuns podem ser pretos-velhos, caboclos, boiadeiros, mineiros, crianças, marinheiros, ciganos, baianos, orientais, xamãs e exus.


ORIXÁS:

“Orisha” é uma palavra “yoruba” para designar um ser sobre-humano, ou um deus. Sobre os orixás, são consideradas duas vertentes distintas: monoteísta e politeísta.
Na monoteísta, os orixás são manifestações do Grande Deus Olorum, criador de tudo. Todo o universo surge de Olorum através das radiações que são individualizadas e personificadas em orixás. Essas radiações são personificadas de formas diferentes nos diversos terreiros - depende da influência histórica que cada um sofreu.

Na politeísta, cada orixá é considerado um deus que se manifesta através dos elementos da natureza.

Quando começou o tráfico de escravos, muitos negros de tribos diferentes foram vendidos juntamente, desta maneira os diversos orixás de tribos distantes se encontraram em terras brasileiras e formaram o grande panteão do Candomblé. Notadamente a nação que mais influenciou foi a Iorubá.

Nesta visão ainda própria dos ritos tribais, o orixá era um ancestral que todos tinham em comum. Geralmente era considerado como o próprio fundador da tribo e deixava grande influência por suas características incomuns de liderança, poderes espirituais e grande habilidade de caça. A tribo tinha no orixá um símbolo da união, pois todos eram filhos diretamente desse grande ancestral; com isso surge o termo Orixá histórico - realmente um rei, rainha, feiticeiro, guerreiro que existiu.

A partir da umbanda se configura a uma nova visão: o Orixá Cósmico. O orixá, pela cosmogonia umbandista, nunca viveu na terra, ele é muito mais que o espírito desencarnado de um homem; Toda criação é o resultado do trabalho harmônico dos orixás, espíritos elevadíssimos, verdadeiros arquitetos e mantenedores da criação.
Os Orixás são sete: Oxalá, Iyemonjá, Oxun, Xangô, Oxósse, Exú e Nanã.



RITUAIS E DEUSES:

Os rituais do candomblé são realizados em templos chamados casas, roças ou terreiros que podem ser de linhagem matriarcal (quando somente as mulheres podem assumir a liderança), patriarcal (quando somente homens podem assumir a liderança) ou mista (quando homens e mulheres podem assumir a liderança do terreiro). A celebração do ritual é feita pelo pai de santo ou mãe de santo, que inicia o despacho do Exu. Em ritmo de dança, o tambor é tocado e os filhos de santo começam a invocar seus orixás para que os incorporem. O ritual tem no mínimo duas horas de duração.

Candomblé o culto é voltado unicamente aos Orixás, que são os deuses supremos. Possuem personalidade e habilidades distintas, bem como preferências ritualísticas. Estes também escolhem as pessoas que utilizam para incorporar no ato do nascimento, podendo compartilhá-lo com outro orixá, caso necessário.

No Candomblé os cânticos são em línguas africanas (Iorubá ou Banto), dependendo da nação de origem daquele grupo. Os cânticos da Umbanda são em português. 



SINCRETISMO: UMBANDA E CANDOMBLÉ:

A umbanda prega a existência pacífica e o respeito ao ser humano, à natureza e a Deus.

Em decorrência de suas raízes, a umbanda tem um caráter eminentemente pluralista, compreende a diversidade e valoriza as diferenças.

Não há dogmas ou liturgia universalmente adotadas entre os praticantes, o que permite uma ampla liberdade de manifestação da crença e diversas formas válidas de culto.

A máxima dentro da umbanda é “Dê de graça, o que de graça recebestes: com amor, humildade, caridade e fé”.

Há discordância sobre as cores votivas de cada orixá conforme o local do Brasil e a tradição seguida por seus seguidores. Da mesma forma quanto ao Santo sincretizado a cada orixá.


Alguns exemplos:

Exu - Santo Antonio no Rio de Janeiro, chamado de Bará no Rio Grande do Sul;
Oxumaré - São Bartolomeu no Brasil
Ogum - São Jorge, principalmente no centro-sul do Brasil e Santo Antonio na Bahia.


CANDOMBLÉ:

Origem:

O candomblé é uma religião africana trazida para o Brasil no período em que os negros desembarcaram para serem escravos. Escravos de diversas tribos e nações Africanas continuaram a cultuar no Brasil os Orixás negros, suas divindades, e estiveram na origem da criação das chamadas “Casas de Santo” (Ilê), onde continuaram com os seus rituais e preceitos Africanos. Nesse período, a Igreja Católica proibia o ritual africano e ainda tinha o apoio do governo, que julgava o ato como criminoso, por isso os escravos cultuavam seus Orixás, Inquices e Vodus omitindo-os em santos católicos. As diversas origens das tribos, e as diversas regiões do Brasil onde se implantaram, deram origem às diversas Nações do Candomblé, onde o Ketu é tido como o mais tradicional.






YEMANJÁ, a mãe da vida!


Muito bom dia aos meus caríssimos e fraternos irmãos da nossa querida YORIMÁ, SABEDORIA! Chegamos enfim, ou já, no dia 08 de Dezembro desse derradeiro ano ... então, temos apenas 23 dias para o término desse último mês do ano.

Vocês têm conhecimento de que o sincretismo que ainda é utilizado tanto na Umbanda como no Candomblé, faz surgirem dúvidas como essa: - Afinal dia 8 de Dezembro é de Iemanjá ou Oxum? – Respondo: - Depende do sincretismo que sua casa adotou.

Vejamos: Em milhares de terreiros em São Paulo, Iemanjá é sincretizada com Nossa Senhora da Conceição que é louvada no dia 8 de Dezembro. Já em outras regiões, como a Bahia, por exemplo, o sincretismo se faz com Nossa Senhora dos Navegantes, cujos festejos ocorrem no dia 2 de Fevereiro, ou seja, é uma questão de regionalismo sincrético.

Isso muda alguma coisa para nós, integrantes da Umbanda e do Candomblé? Não! Na realidade tanto em um dia como em outro, nossas homenagens são para Iemanjá, a rainha do mar, que nada tem a ver com as santas citadas (que na verdade é apenas uma - Maria, a mãe de Jesus- apesar do plural ). Apenas seguimos o calendário católico para que haja uma data de louvor à grande mãe dos Orixás. Ninguém está errado desde que tenhamos em mente as diferenças existentes entre a Orixá e a Virgem. Louvamos ambas. Porque não?

Iemanjá, Iyemanjá, Yemanjá, Yemaya, Iemoja, ou Yemoja, Dandalunga (angolas), Kaiala (congos), Janaína, Inaê, Sobá, Oloxum, Princesa de Aiucá, Sereia Mukunã, Senhora da Calunga Grande, Rainha do Mar ou Senhora da Coroa Estrelada.

Estes são alguns dos nomes que designam Yemanjá, a Divindade que na Umbanda é a Grande Mãe, a Mãe da Geração.

Yemanjá é a Divindade que está assentado no pólo universal positivo ou irradiante do Trono da Geração e da Vida e que rege a Sétima Linha de Umbanda (Linha da Geração), onde polariza com o Orixá Omolu (Trono Masculino da Geração), cujo magnetismo é negativo ou absorvedor.

Yemanjá, a Mãe da Vida, é a água que vivifica; e Pai Omulu é a terra que amolda os viventes.

O campo preferencial de atuação de Yemanjá é no amparo à maternidade, porque Ela é Senhora do Mistério Maternal. Simboliza a maternidade, o amparo materno, a mãe propriamente, “a Mãe da Vida”.

Mãe Yemanjá representa a Manifestação das Qualidades Geradora e Criativa do Divino Criador. É o Orixá Universal que irradia continuamente as Qualidades geradoras da vida e da criatividade, abençoando todos os seres de forma natural, sem forçar ninguém. E sempre ampara aqueles que pedem e buscam essas bênçãos.

Ela irradia o tempo todo seu Fator Gerador e Criacionista, que estimula a geração e a criatividade das pessoas, trazendo oportunidades de crescimento nos Sete Sentidos da Vida, pois irá estimular a geração de vidas, de idéias, de fé, de amor, de conhecimento etc.

Nos mitos da Criação do Universo, Ela é a representação do Princípio Feminino, é “o aspecto Mãe” do Criador. É conhecida como “a Mãe de todos os Orixás” porque está na origem de todas as coisas.
O principal elemento de Yemanjá é a água, o elemento das emoções. O mar é regido por Ela; e a Ciência estuda que a origem da vida está nas águas.


O mar representa todas as águas, já que todas as águas correm para o mar. E o mar “lava” os nossos problemas e mágoas e renova a nossa vontade de viver, justamente porque a sua energia é uma Emanação da Mãe da Vida. Assim, podemos pedir a Yemanjá que nos ajude a lidar com as nossas emoções e a equilibrá-las.

A Regência de Yemanjá vai muito além da geração através do sexo, pois representa a Geração da Vida no sentido mais amplo: a geração dos seres, das criaturas e das espécies; e a doação da criatividade que permite aos seres encontrarem seus “pares”, unindo-se a eles para se multiplicarem e conseguirem melhores resultados nas suas vidas. Esses “pares” são as Energias emanadas por este Orixá, que podemos atrair para nos ajudar a desenvolver nossos potenciais; e também podem surgir como pessoas, companheiros, parceiros de caminhada, grupos de estudos e atividades etc. Tudo isso está contido no Mistério Maternal de Yemanjá, que nos dá equilíbrio emocional e energético, gerando novos caminhos e oportunidades em nossas vidas.

Desse modo, podemos pedir à Mãe Yemanjá a bênção da criatividade sempre que formos iniciar algum projeto novo e quando precisarmos encontrar novas fórmulas de viver e novos caminhos (de trabalho, de fazer as coisas, de encarar os desafios da vida).

Associada ao movimento das águas e à fertilidade, Yemanjá é dona de grande poder de sedução e capaz de encantar os marinheiros e arrastá-los para o seu palácio submerso, de onde nunca mais retornam… Podemos entender isso como a necessidade que o ser humano tem de manter o equilíbrio emocional, para não cair num mergulho em emoções desequilibradas, sempre de difícil retorno…
Suas águas salgadas simbolizam as lágrimas de uma mãe que sofre pela vida de seus filhos, que os vê se afastarem de seu abrigo, tomando rumos independentes.

Além de protetora da vida marinha, Yemanjá é principalmente a protetora da harmonia familiar, do lar, do casamento e do nascimento, é a Sua força que ampara o momento do nascimento de um bebê.
A Regência de Yemanjá em nossas vidas se manifesta na necessidade de sabermos se aqueles que amamos estão bem e protegidos; é a preocupação, é o amor ao próximo, principalmente em relação àqueles que nos são queridos.

É Ela quem nos dá um sentido de união, de grupo, transformando a convivência num ato familiar, criando dependências e raízes, proporcionando sentimentos de irmão para irmão, de pai para filho, com ou sem laços consanguíneos. É uma energia Sagrada que nos integra no Todo da Criação de forma amorosa e maternal.

Nos templos africanos, é retratada como uma mulher de seios fartos e semblante calmo, porém decidido. O simbolismo dos “seios fartos” é o da Grande Mãe que provê o alimento necessário a todos os filhos. E aqui a palavra “alimento” corresponde às Energias Divinas que Ela não cessa de Irradiar sobre todos os seres, espécies e elementos, mantendo e renovando a imensa Teia da Vida.


HISTÓRIA

Yemanjá na África – Yemanjá ou Yemoja é o Orixá dos Egbá, uma Nação Iorubá outrora estabelecida na região entre Ifé e Ibadan, onde existe ainda o rio Yemoja. Yemanjá era cultuada às margens desse rio.

Seu nome, assim como o de todos os Orixás, vem da cultura Nagô, de língua Iorubá, e deriva de “Yèyé Omo Ejá”, que significa a Mãe cujos filhos são peixes ou a Mãe de muitos filhos (Yèyé ou Yê= mãe; Omo= filhos; Ejá= peixes).

As guerras entre Nações Iorubás levaram os Egbá a emigrarem na direção oeste, para Abeokutá, no início do século XIX. Obviamente que não poderiam levar consigo o rio Yemoja, então os Egbá transportaram os objetos sagrados de suporte do axé da Divindade, passando a cultuá-la no rio Ògùn, que atravessa a região. Pierre Verger afirma que este rio Ògùn não deve ser confundido com Ogum, o deus do ferro e dos ferreiros, baseando esta afirmação nos ensinamentos mais antigos e tradicionais sobre a Divindade Ogum, e inclusive contrariando escritos de alguns autores do final do século passado.

O principal templo de Yemanjá está em Ibará, um bairro de Abeokutá. Seus fiéis, todos os anos, vão buscar a água sagrada numa fonte do rio Lakaxa, que é um afluente do rio Ògùn, para lavar os axés da Divindade. Essa água é recolhida em jarras, transportada numa procissão seguida por pessoas que carregam esculturas de madeira (ère) e um conjunto de tambores. Na volta, o cortejo vai saudar as pessoas importantes do bairro, começando por Olúbàrà, o rei de Ibará.


Entre os Egbá, Yemanjá ou Yemojá é saudada como “Odò ìyá” (Odo=rio; ìyá= mãe). Ela é filha de Olokun, Divindade riquíssima, dona do oceano e de todas as suas riquezas. Em Ifé, Olokun é uma Divindade feminina, uma deusa do mar; e em Benin e Lagos, é cultuada como Divindade masculina, é um deus do mar.

Numa história de Ifá, Yemanjá aparece casada pela primeira vez com Orumilá, Senhor das Adivinhações; e depois com Olofin, Rei de Ifé.

Segundo as lendas, desse casamento com Olofin, Yemanjá teve dez filhos, entre eles Oxumarê (“O arco-íris que se desloca com a chuva e guarda o fogo nos seus punhos”) e Xangô (“O trovão que se desloca com a chuva e revela seus segredos”).

Yemanjá também foi casada com Oxalá; união que representa a fusão do céu com o mar, no horizonte.

Considerada a Mãe de todos os Orixás e da humanidade, Yemanjá simboliza a manifestação da procriação, da restauração das emoções e a fecundidade. É a grande provedora, que proporciona o sustento a todos os seus filhos. (Do livro “Orixás” – Pierre Fatumbi Verger – Editora Corrupio.)
Yemanjá no Novo Mundo – Yemanjá é uma Divindade muito popular no Brasil e em Cuba.

Usa roupas cobertas de pérolas e tem filhos no mundo inteiro. Está em todo lugar aonde chega o mar.
Seu axé é assentado sobre pedras marinhas e conchas, guardadas numa porcelana azul.

Nas religiões de matriz africana, o sábado é o dia da semana que lhe é usualmente consagrado, juntamente com outras Divindades femininas.

Suas comidas rituais ou votivas consistem de carneiro e pato, além de preparados à base de milho branco, azeite, sal e cebola.

Seus adeptos usam colares de contas de vidro transparentes e vestem-se, de preferência, de azul-claro.
Em Cuba, Yemanjá é reverenciada como Yemajá ou Yemayá e também relacionada às cores azul e branca. É uma Rainha do Mar Negra, que assume o nome cristão de “La Virgen de la Regla” e faz parte da Santeria, como Santa Padroeira dos portos de Havana.

Yemanjá no Brasil– Entre as Mães Orixás, Yemanjá é a mais popular, sendo festejada em todo o Brasil como a Rainha do Mar, a Padroeira dos náufragos, a Grande Mãe, a Mãe de todas as cabeças humanas. Na versão de Pierre Verger, Ela representa a mãe que protege os filhos a qualquer custo, a mãe de vários filhos (peixes), que adora cuidar de crianças e de animais domésticos.

Além dos muitos nomes africanos pelos quais é conhecida, a forma portuguesa Janaína também é utilizada; e foi criada como a maneira mais branda de “sincretismo” encontrada pelos africanos aqui escravizados para a perpetuação dos seus Cultos. Várias composições de autoria popular foram realizadas de forma a saudar a “Janaína do Mar”, e algumas como canções litúrgicas.

Diz JORGE AMADO: “Iemanjá, rainha do mar, é também conhecida por dona Janaína, Inaê, Princesa de Aiocá e Maria, no paralelismo com a religião católica. Aiocá é o reino das terras misteriosas da felicidade e da liberdade, imagem das terras natais da África, saudades dos dias livres na floresta”.

Se na África Yemanjá é relacionada a um rio, no Brasil Ela é associada às águas salgadas do mar; já que as águas doces dos rios são o domínio de Oxum. Por isso, as praias são o palco sagrado de grandes festas de homenagem a Yemanjá.

No Brasil, Yemanjá goza de grande popularidade entre os seguidores da Umbanda, do Candomblé, do Batuque, do Xambá, do Xangô do Nordeste, do Omolokô e mesmo entre fiéis de outras religiões, pois o arquétipo da Grande Mãe está presente no inconsciente dos povos. Muitas festas a homenageiam. Flores, perfumes, jóias e bijuterias são algumas das oferendas que recebe nessas ocasiões.

No Rio de Janeiro e em Natal, Yemanjá é homenageada na passagem do ano.

Na Bahia e no Rio Grande do Sul, as maiores festas acontecem no dia 02 de fevereiro. A grande festa baiana ocorre na Praia do Rio Vermelho, em Salvador. Já no Rio Grande do Sul os maiores festejos são em Porto Alegre e Pelotas.

Em São Paulo e em João Pessoa, na Paraíba, Yemanjá é celebrada no dia 08 de dezembro. Na mesma data, a Bahia realiza duas outras festas para a Mãe das Águas.

Em São Paulo, as maiores comemorações ocorrem no município de Praia Grande, Litoral Sul, com milhares de fiéis. A tradição teve início em 1969, quando uma grande imagem de Yemanjá foi colocada perto da Vila Mirim, por iniciativa de Pai Demétrio Domingues e de outros líderes Umbandistas da época. Vale lembrar que o dia 08 de dezembro é consagrado a Nossa Senhora da Conceição, dentro da liturgia Católica, e que esta Santa sincretiza com o Orixá Oxum. Pai Ronaldo Linares conta que na década de 60, neste dia 08, se fazia uma Festa para Oxum, onde havia “um encontro de Oxum com Yemanjá”, na Praia das Vacas, no município paulista de São Vicente. Depois, esse “encontro” deixou de ocorrer e a data ficou reservada para festejar apenas Yemanjá.

Em João Pessoa, 08 de dezembro é o feriado municipal consagrado a Nossa Senhora da Conceição e também o dia de tradicional Festa de Yemanjá. Todos os anos, na Praia de Tambaú, instala-se um palco circular cercado de bandeiras e fitas azuis e brancas, ao redor do qual se aglomeram fiéis oriundos de várias partes do Estado para assistir ao desfile dos Orixás e, principalmente, da homenageada. Pela praia, encontram-se buracos com velas acesas, flores e presentes. Em 2008, segundo os organizadores da festa, 100 mil pessoas compareceram ao local.

Ainda em 08 de dezembro a Bahia realiza outras duas festas para Yemanjá. Uma delas acontece pelo sincretismo com a Padroeira da Bahia, Nossa Senhora da Conceição da Praia, sendo feriado municipal em Salvador. A outra é realizada no Monte Serrat, na Pedra Furada, em Salvador, denominada “Presente de Yemanjá”, uma manifestação popular que tem origem na devoção dos pescadores locais à Rainha do Mar, também saudada como Janaína.

Existe um sincretismo entre a Santa Católica Nossa Senhora dos Navegantes e o Orixá Yemanjá. Em algumas regiões do Brasil, ambas são festejadas no dia 02 de fevereiro, com uma grande procissão fluvial.

Uma das maiores festas do Dois de Fevereiro ocorre em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. No mesmo Estado, em Pelotas, a imagem de Nossa Senhora dos Navegantes vai até o Porto de Pelotas. Antes do encerramento da festividade Católica, acontece um dos momentos mais marcantes da celebração: as embarcações param e são recepcionadas por Umbandistas que carregam a imagem de Yemanjá, proporcionando um encontro ecumênico assistido da orla por muitas pessoas. Em Pelotas, a Festa de Yemanjá acontece à noite, sob a coordenação da Federação Sul Riograndense de Umbanda e com o apoio da Prefeitura; e durante o dia a Festa Católica a Nossa Senhora dos Navegantes é organizada pela Diocese local.

No Rio de Janeiro, Yemanjá é festejada na passagem de ano. Milhares de pessoas comparecem e depositam no mar oferendas para a Divindade. A celebração inclui o tradicional “banho de pipocas” e as sete ondas que os fiéis e até mesmo seguidores de outras religiões pulam, como forma de pedir sorte à Grande Mãe Orixá (sete ondas, simbolizando os sete Sentidos da Vida).







quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

"A VIRGEM DA COROA"

As quartas-feiras são cultuados os orixás Iansã, Xangô e Obá, dia ideal para trabalhos espirituais e orações ligados as conquistas na justiça dos homens e na justiça divina através da força de Xangô. Vencer batalhas e dificuldades são os atributos de Iansã e Obá.
Iansã, Inhansã (do iorubá Iyà Yánsàn, "mãe de nove"), ou Oiá (de Ọyà, nome iorubá do rio Níger), Oyá em castelhano, é a orixá dos ventos, das tempestades e do rio Níger, cujas inundações controla. Foi esposa de Ogum e Xangôe tem um temperamento ardente e impetuoso. As danças de Iansã são guerreiras e, se Ogum está presente, ela se engaja em duelo com ele, em lembrança de suas antigas divergências. Seus fiéis a saúdam gritando Epa Heyi Oya!. Seus ritmo é chamados agó, ilu, ou aguerê de Iansã e de tão rápido, repicado e dobrado, também é conhecido como "quebra-prato". É o mais rápido ritmo do candomblé, correspondendo à personalidade agitada, contagiante e sensual desta deusa guerreira, senhora dos ventos e que tem poder de afastar os espíritos dos mortos (eguns). Ela evoca, por meio de movimentos sinuosos e rápidos, tempestades e ventos furiosos. No candomblé, as pessoas dedicadas a Iansã usam colares de contas de cor vermelha ou coral. A quarta-feira lhe é consagrada, assim como a Xangô. Seus símbolos são os chifres de búfalo, um alfanje e o iruexim ou iruquerê (espanta-moscas de rabo de búfalo), com o qual comanda os eguns (espíritos dos mortos). Recebe sacrifícios de cabras e oferendas de acarajés, ekuru e abará. Ela detesta abóbora e a carne de carneiro lhe é proibida, assim como a arraia. Na Bahia, é homenageada no dia 4 de dezembro na Festa de Santa Bárbara (padroeira do Corpo de Bombeiros e dos mercados), evento composto de missa, procissão feita por católicos e praticantes do Candomblé, além das festas nos terreiros, o caruru de Iansã, samba de roda e apresentação de grupos de capoeira e maculelê.
Na santería cubana, Oiá é sincretizada com imagens de Nossa Senhora da Candelária, Nossa Senhora da Anunciação e Santa Teresa.
O arquétipo de Iansã é o das mulheres audaciosas, poderosas e autoritárias. Mulheres que podem ser fiéis e de lealdade absoluta em certas circunstâncias, mas que, em outros momentos, quando contrariadas em seus projetos e empreendimentos, deixam-se levar a manifestações da mais extrema cólera. Mulheres, enfim, cujo temperamento voluptuoso e sensual pode levá-las a aventuras extraconjugais múltiplas e frequentes, o que não as impede de continuarem muito ciumentas de seus maridos, por ela enganados.
LENDAS DE IANSÃ
Antes de se tornar mulher de Xangô, Iansã (Oiá) viveu com Ogum. Lamentando não ter filhos, consultou um Babalaô que a aconselhou fazer oferendas, entre essas um pano vermelho. Cumprida a obrigação, tornou-se mãe de nove crianças, o que, em iorubá, se exprime pela frase Iyá omo mesan, origem de seu nome Iansã.
Ogum ia abater um imponente búfalo quando viu a pele do animal se abrir e de dentro sair a bela Oiá! Linda, ricamente vestida e cheia de ornamentos que valorizavam sua beleza e sensualidade. Ela dobrou a pele do búfalo e o escondeu num formigueiro, dirigindo-se para a cidade. Ogum a seguiu e, dominado pela sua beleza, propôs-lhe casamento, sem ser aceito. Ogum, então voltou, pegou a pele no esconderijo e a guardou para si, voltando para a cidade. Quando Oiá, descobriu o roubo da pele, voltou a cidade e encontrando Ogum a sua espera, acusou-o, exigiu o que era seu e Ogum não admitiu nada. Oiá percebeu que teria de render-se e aceitar as propostas de Ogum, se quisesse seus pertences de volta. Mas impôs-lhe três condições: ninguém nunca poderia dizer-lhe diretamente que era um animal; ninguém nunca poderia usar cascas de dendê para fazer fogo; e ninguém nunca poderia rodar um pilão pelo chão da casa. Ogum aceitou e se casaram. Isso desagradou as demais mulheres de Ogum. Após o nono filho de Oiá, as demais mulheres, enciumadas, embriagaram Ogum com vinho de palma e conseguiram que ele lhes contasse o segredo de Iansã. Elas então acusaram-na de ser um animal e lhe disseram onde estavam suas pele, chifres e cascos. Oiá fingiu que não era com ela, mas quando sozinha, correu até o lugar indicado e achou seus pertences. Vestiu-os e eles se ajustaram perfeitamente, retomou a força do animal e com raiva atacou as outras mulheres e as matou. Ela pretendia voltar para a floresta, mas seus filhos a chamavam de volta. Ela então pegou seus chifres e os deu a eles, dizendo-lhes que se algum dia dela precisassem, que os tocasse e ela surgiria para defendê-los.
Oxaguiã estava em uma guerra que não acabava nunca, tão poucas eram as armas para guerrear. Ogum fazia as armas, mas lentamente. Oxaguiã pediu urgência, mas o ferreiro já fazia o possível. Oiá, esposa do ferreiro, resolveu ajudar Ogum a apressar a fabricação. Pôs-se a soprar o fogo da forja de Ogum e avivou o fogo, que derretia o ferro mais rapidamente. Logo Ogum pode fazer muitas armas e Oxaguiã venceu a guerra. Oxaguiã veio então agradecer a Ogum, mas enamorou-se de Oiá. Um dia, fugiu com ela, deixando Ogum enfurecido e sua forja fria. Quando mais tarde Oxaguiã voltou à guerra e precisou de armas, Oiá teve que voltar a avivar a forja. Lá da casa de Oxaguiã, onde vivia, soprava em direção à forja de Ogum, atravessando toda a terra que separava a cidade de Oxaguiã da de Ogum. Seu sopro cruzava os ares e arrastava consigo pó, folhas e tudo o mais pelo caminho, até chegar às chamas com furor. O povo se acostumou com o sopro de Oiá cruzando os ares e logo o chamou de vento. Quanto mais a guerra era terrível e mais urgia a fabricação das armas, mais forte soprava Oiá a forja de Ogum. Tão forte que às vezes destruía tudo no caminho, levando casas, arrancando árvores, arrasando cidades e aldeias. O povo reconhecia o sopro destrutivo de Oiá e o povo chamava a isso tempestade.
Uma vez Oxum passou pela casa de Iansã e a viu na porta. Ela era linda, atraente, elegante. Oxum então pensou: "Vou me deitar com ela". E assim, muitas vezes, passou na frente daquela casa. Levava uma quartinha de água na cabeça, e ia cantando, dançando, provocando. No começo, Iansã não se deu conta do assédio, mas depois acabou por se entregar. Mas Oxum logo se dispôs a nova conquista e Iansã a procurou para castigá-la. Oxum teve que fugir para dentro do rio,lá se escondeu e lá vive até hoje.
Oxum teve uma grande paixão por Erinlé, mas na época era casada com Ogum. Numa das saídas de Ogum para guerrear, Oxum encontrou Erinlé e dele engravidou. Nove meses depois, quando a criança estava para nascer, Ogum avisou que estava regressando. Oxum, que não podia mostrar a ele a criança, deu a luz a um menino, deixou-o em cima de um lírio e foi embora. Iansã, ao passar, viu a criança que sabia ser de Oxum, pegou-a e a criou. Seu nome era Logunedé. Iansã o ensinou a caçar e pescar e viveu com ele por muito tempo.
Houve uma festa com todos os Orixás presentes, menos Omolu. Ogum perguntou por que o irmão não vinha e Nanã respondeu que era por vergonha de suas feridas causadas pelas doenças. Ogum resolveu ajudá-lo e o levou à floresta, onde lhe teceu uma roupa de palha para lhe cobrir todo o corpo. Mas muitos viram o que Ogum fez e continuaram com nojo de Omolu, menos Iansã que, altiva e corajosa, dançou com ele. Então o vento de Iansã levantou a palha e para espanto de todos, revelou um homem lindo, sem defeito algum. Todos os Orixás ficam estupefatos, principalmente Oxum,que se enche de inveja, mas Omolu, não quer dançar com mais ninguém. Em recompensa pelo gesto de Iansã, Omolu dá a ela o poder de também reinar sobre os mortos (eguns).
Xangô gostava de sentar-se ao lado da forja para ver Ogum trabalhar. Vez por outra, ele olhava para Iansã. Iansã, também, espiava furtivamente Xangô. Xangô era vaidoso e cuidava muito da sua aparência, a ponto de trançar seus cabelos como os de uma mulher. Ele fizera furos nos lobos de suas orelhas, onde pendurava argolas. Usava braceletes e colares de contas vermelhas e brancas. Muito impressionada pela distinção e pelo brilho de Xangô, Iansã fugiu com ele e tornou-se sua primeira mulher.
Xangô enviou Iansã em missão na terra dos baribas, a fim de buscar um preparado que, uma vez ingerido, lhe permitiria lançar fogo e chamas pela boca e pelo nariz. Oiá, desobedecendo ao marido, experimentou o preparado e tornou-se também capaz de cuspir fogo, para grande desgosto de Xangô, que desejava guardar só para si esse terrível poder.

Certa vez, Xangô foi visitar o irmão Ogum e conheceu sua mulher Iansã. Os dois se apaixonaram e Iansã largou Ogum, indo viver com Xangô. Tempos depois, com saudades, Iansã voltou para Ogum; então Xangô chamou seu exército e atacou o reino do irmão. Enquanto lutavam, Ogum mandou Iansã para o reino de Oxóssi. Quando Xangô, vencedor, foi buscá-la, ela se casara com Oxóssi. Atacou-o, e Oxóssi mandou Iansã para o reino de Omolu. E a história se repetiu, até que Iansã foi mulher de todos os Orixás. Mas no final acabou voltando a viver com Xangô, e de sua união nasceram os gêmeos Ibeji.
Xangô construiu um palácio de cem colunas de bronze. Ele tinha um exército de cem mil cavaleiros. Vivia entre suas mulheres e seus filhos. Iansã, sua primeira mulher, era bonita e ciumenta. Oxum, sua segunda mulher, era coquete e dengosa. Obá, sua terceira mulher, era robusta e trabalhadora. Sete anos mais tarde, foi o fim do seu reino: Xangô, acompanhado de Iansã, subira à colina Igbeti, cuja vista dominava seu palácio de cem colunas de bronze. Ele queria experimentar uma nova fórmula que inventara para lançar raios. Bummm!!! A fórmula era tão boa que destruiu todo o seu palácio! Adeus mulheres, crianças, servos, riquezas, cavalos, bois e carneiros. Tudo havia desaparecido fulminado, espalhado e reduzido a cinzas. Xangô, desesperado, seguido apenas por Iansã, voltou para Tapá. Entretanto, chegando a Kossô, seu coração não suportou tanta tristeza. Xangô bateu violentamente com os pés no chão e afundou-se terra adentro. Iansã, solidária, fez o mesmo em Irá. Oxum e Obá transformaram-se em rios e todos tornaram-se orixás.
OS NOVE FILHOS DE IANSÃ
O nome Iansã, como dito acima, significa "mãe de nove" (com Ogum, Oxóssi ou Xangô, dependendo da versão) e uma versão do mito conta que oito nasceram mudos e o último, Egun, graças aos sacrifícios recomendados por Ifá, nasceu com o poder de falar com voz estranha e sobrenatural. Algumas tradições especificam os nomes dos nove filhos que, segundo uma delas, seriam:
Imalegã - nasceu no primeiro dia. Foi tirado do ventre de Oiá pelas Iyami e envolvido em abanos;
Iorugã - foi envolvido em palha seca e alimentado com talos de bananeira. Nasceu com a vaidade de Oiá e é o preferido.
Akugã - nasceu do terceiro dia da tempestade e foi criado nas touceiras de bambu. É rebelde. Não se deve tocar o chão do bambuzal.
Urugã - alimenta-se das folhas das bananeiras e esconde-se nas florestas. Faz buracos.
Omorugã - alimenta-se do pó do bambu que está caído no chão. Vive no milharal e fica escondido nos bambuzais observando os seres humanos.
Demó - Oiá cobriu-o de lama para saber os segredos de seus inimigos. Usa pele de búfalo para acompanhar Oxóssi.
Reigá - Acompanha os mortos e ronda os cemitérios. Esconde-se nas grandes árvores dos cemitérios e ronda as sepulturas à procura de objetos perdidos ou esquecidos pelas pessoas.
Heigá - É violento e vive perseguindo o Ori do ser humano. Propicia desastres e desordens;
Egungun - Oiá preparou-o para combater. Apossa-se do ser humano, fazendo-o cometer desatinos.
QUALIDADES DE IANSÃ
Ygbalè ou Iybalé: é a deusa dos mortos, ligada diretamente ao culto de Egun, por isso senhora dos cemitérios. Tem pleno domínio sobre os mortos, trazendo consigo uma falange de Eguns que ela controla e administra , pois todos temem o seu terrível poder. Devido a sua relação com Egun, é proibido vesti-la de vermelho. Sua vestimenta é branca.
Furé: usa uma foice na mão esquerda e um aruexim na direita, veste branco e por cima de suas vestes a palha da costa. Dança como se estivesse carregando na cabeça uma enorme cabaça. Em suas vestes vão pequenas cabaças dependuradas, no tornozelo direito uma pulseira de aço, tem ligação direta com o culto a morte e aos Eguns e preside a vida e a morte.
Odo: ligada as águas , apaixonada carnal e muito louca por amor.
Iamesan: É a que foi esposa de Oxóssi, meio animal e meio mulher, só come caça, mãe dos nove filhos. Come com Oxóssi nas matas.
Onirá: é uma orixá das águas doces cujo culto no Brasil confundiu-se com o de Iansã por ser uma guerreira. Seu culto na África era independente. Tem ligação com o culto a Egun e laços de amizade com Oxum, pois foi Onira quem ensinou Oxum Opará a guerrear. É a dona do atori, uma pequena vara usada no culto de Oxalá para chamar os mortos na intenção de fazê-los participar da cerimônia. 
Também é usado para fazer reinar a paz no local ou na vida de alguém e trazer-lhe abundância e tem o poder de mandar chover regularmente para trazer a prosperidade. Ela deu a Oxaguiã o atori e seu poder de exercê-lo, além de ter lhe ensinado o fundamento e como usá-lo. É ainda a mãe de criação de Logunedé Apanan. Por isso, toda oferenda para ela deve ser acompanhada de um agrado a essa qualidade do orixá Logunedé. É uma Orixá muito perigosa por sua ligação e caminhos com Oxaguiã, Ogum e Obaluaiê. Veste o coral e amarelo, contas iguais.
Yatòpè: tem ligação forte com Xangô. Veste branco.
Afefe Iku Funã: senhora do fogo e dos ventos da morte. Caminha com Ogum e Obaluaiê e tem caminhos, também, com Egun e Iku (morte). Veste branco ou azul-claro.
Afakarebò: não é feita em seus eleitos, é a verdadeira dona a quem são entregues todos os ebós. Seus caminhos levam diretamente a Exu e Egun. Seus rituais são todos feitos no murim, cabaças e porrões.
Afefe: comanda os ventos. Tem caminhos com Obaluaiê e Egun.Veste vermelho e branco, usa o coral e o chorão de seu adé é alaranjado .
Bagan: não tem cabeça. Come com Exu, Ogum e Oxóssi. Tem caminhos com Egun.
Petu: ligada aos ventos e as árvores. Esposa de Xangô, que vai sempre na frente anunciando sua chegada.
Ogunnita ou Egunitá: ligada ao culto de Egun, seu fundamento mais forte. É a senhora que caminha com os mortos. Alguns umbandistas como Rubens Saraceni e Alexandre Cumino tendem a separar esta manifestação de Iansã das demais, criando assim um orixá feminino individual. Egunitá nessa visão seria a senhora da espada flamejante, a mãe ignea associada a Santa Brígida ou mesmo a Santa Sara Kali dos ciganos.
IANSÃ NA UMBANDA
Iansã / Santa Bárbara, na umbanda
Na umbanda, o símbolo de Iansã é uma taça ou cálice e as contas usadas por seus filhos e filhas são amarelas. Ela é normalmente sincretizada com Santa Bárbara, mas com Santa Madalena na qualidade de Oyá Funã, e com Santa Joana D'Arc na de Oyá Iybalé. Na interpretação mais tradicional, é a líder de uma das falanges da linha de Iemanjá, como "Cabocla Iansã".
Em outra interpretação, é considerada parte da linha de Xangô. Atua como o pólo ativo da linha da Justiça, enquanto Xangô é seu aspecto assentado ou imutável.
Chamada também de "A Virgem da Coroa", Iansã é de expressão séria e porte de guerreira, batalhadora e lutadora. Iansã na umbanda incorpora com expressão altiva e com o braço direito estendido para cima e com a mão direita a balançar, como se estivesse chamando os raios. Sua imagem é a de Santa Bárbara, ou seja, uma moça de cabelos claros com uma túnica vermelha por cima de um vestido amarelo, segurando um ramo ou uma espada. As cores de Iansã na Umbanda variam conforme a região, o que se reflete nas cores de suas velas votivas. No centro do país os terreiros usam as cores amarela ou vermelha. Já no Rio Grande do Sul alguns terreiros usam a cor azul-escura.








domingo, 2 de dezembro de 2018

O ESPELHO DE OXUM



Conta à lenda que, em um tempo imemorial, o rei Xangô, orixá escolhido por Oxalá para governar a terra e os outros deuses, tinha diversas esposas. As duas mais importantes eram Yansã, a Senhora das Tempestades, e Oxum, cujo domínio se estendia pelos rios, lagos e cachoeiras.Certo dia, enciumada da preferência de Xangô pela sua adversária; Yansã decidiu vingar-se de Oxum e, em um raio intempestivo de cólera, investiu contra a mãe das águas doces, quando esta se banhava nua às margens de um grande lago, tendo apenas um espelho entre as mãos. Devido ao fato de não ser uma guerreira, mas uma mulher dócil e vaidosa, afeita apenas aos expedientes da Sedução e da Dissimulação para se defender; Oxum viu-se completamente indefesa frente à ira arrebatadora da Rainha dos Raios. Oxum, então, rezou a Oxalá e, em um instante mágico, percebeu que o Sol brilhava forte nas costas de sua agressora. Rapidamente, ela utilizou seu espelho para refletir os raios solares de forma a cegar Yansã. Ao saber da vitória de Oxum, o rei Xangô reafirmou sua preferência pela Senhora das Águas, que além de mais bela e delicada, provou ser também mais poderosa que a Senhora das Tempestades.

Um Objeto Singular

    O espelho aparece em inúmeros mitos e ‘reflete’ um sentido claramente universal porque tem um valor cognitivo e epistemológico. Ele é um símbolo da consciência. Consciência entendida não apenas como ‘auto-imagem social ou profissional’, mas, sobretudo como identidade psíquica profunda, a verdadeira face sob as máscara do ego, a centelha luminosa, o reflexo interior do Fiat Lux. Platão e Plotino o comparavam à alma, metáfora que em seguida foi adotada por Santo Atanásio e Gregório Niseno. Mas é com São Paulo que o Espelho se torna um valioso símbolo de transformação, um duplo instrumento para o conhecimento antropomórfico de Deus e para o conhecimento cosmológico do Homem.

"E nós todos que, com a face descoberta, refletimos como em um espelho a glória do Senhor, somos transfigurados nessa mesma imagem, cada vez mais resplandecente, pela ação do Senhor, que é o Espírito. (...) Agora vemos em espelho e de maneira confusa, mas, depois, veremos face a face. Agora o meu conhecimento é limitado, mas, depois, conhecerei como sou conhecido.” 
     
 Mas se o Espelho é símbolo do auto-conhecimento místico, da imagem e semelhança onde o Homem e Deus se refletem, ele também aparece constantemente como metáfora da ilusão narcísica, como confidente da beleza egóica, como um reflexo invertido da realidade. O símbolo da verdade é, ao mesmo tempo, signo da falsidade e da ilusão. E certamente foi este caráter paradoxal e contraditório que criou ‘O fascínio dos Espelhos’.

     Das inúmeras narrativas onde este fascínio se manifesta escolhemos o mito nagô do Espelho de Oxum, originariamente recolhida por Pierre Verger na África, pois ele apresenta vários elementos simbólicos importantes para caracterizar ofuncionamento arquetípico dos mitos que constituem o dispositivo especular e sua estratégia epistemológica. Antes, porém, de analisar os diversos aspectos simbólicos desta lenda mítica, vamos estudar como o tema do espelho se manifesta em outras narrativas de diferentes culturas, procurando identificar suas relações com um arquétipo único, que possa esclarecer o papel universal que o Espelho desempenha na lenda nagô.

    Pelo fato de não emanarem luz própria, mas de refleti-la, os espelhos foram associados à Lua durante toda Antiguidade. Desta associação chave, sobrepuseram-se as que relacionam o Espelho ao feminino e à sua beleza. O simbolismo lunar do Espelho, no entanto, não se limita às mulheres e aos poetas que lhes cantam a beleza, mas encontra lugar também entre os feiticeiros e mágicos, que utilizavam as superfícies espelhadas para entrar em transe, como é o caso dos xamãs siberianos.

    Possivelmente, a tradição de utilização mágica do espelho tenha tido sua origem no fato de ele ter sido usado na astronomia/astrologia  para determinar o movimento das estrelas no céu. Não é sem motivo que o verbo especular, operação mental, procede do latim especulum, que originariamente significava observar o céu, admirar e estudar suas constelações.  Como os estudiosos da ciência dos astros desta época, invariavelmente, eram também magos, os espelhos foram, gradativamente, interiorizados. ”De modo que” - comenta o cabalista Mario Satz - “o espelho não somente está fora de nós, como um artifício metálico, disco polido entrevisto no toucador ou no harém, mas se encontra também entre os hemisférios cerebrais, que invertem o contemplado transladando o esquerdo ao direito e vice-versa.” É curioso observar que este duplo processo de representação da realidade através de espelhos se desenvolveu paralelamente em diversas culturas antigas - na China, na Índia, no Oriente Médio e no Mediterrâneo -  gerando diferentes mitologias astrológicas, mas uma única concepção universal de representação.

    A contemplação deste ‘espelho interior’ é particularmente rica entre os místicos sufis, que o entendem em um sentido semelhante ao de São Paulo, como a imagem de Deus e do Homem. “Deus é, pois” - escreveu Ibn Árabi de Múrcia - “o espelho no qual tu mesmo te vês; do mesmo modo que tú és seu espelho em que Ele contempla seus nomes”. Outro místico sufi, Shabistari, é ainda mais específico em seu Jardim do Mistério

O não-ser é um espelho, o mundo uma imagem, o homem é o olho dessa imagem, e Ele a luz do olho. Quem alguma vez viu o olho através do qual todas as coisas são vistas? O mundo se tornou homem, e o homem, mundo; não há explicação mais clara que essa. Quando olhas atentamente no coração da matéria, Ele é ao mesmo tempo a visão, o olho, a coisa olhada. A Santa Tradição nos legou isto, e sem olho nem ouvido o demonstrou”. 
   
 Também o Zohar, recomenda que, para que o homem possa conhecer a Glória, utilize-se de um espelho, observando-a indiretamente para não ser cego por sua luminosidade resplandecente. Ou seja, o tema do Espelho é uma unanimidade entre os místicos, sejam  judeus, cristãos ou mulçumanos. Este curioso consenso talvez explique a crença, também universal, de que quebrar um espelho acarreta em um longo período de azar ou má-sorte. Também a crença de que as ‘criaturas sem alma sob a forma humana’, como os vampiros e os zumbis, não têm suas imagens refletidas no Espelho; deve ter sua origem na associação universal dos espelhos à imagem holográfica de Deus no Homem, feita em diversas épocas por diferentes religiões.

    Adiante, quando analisarmos a lenda de Oxum, veremos como, devido a sua associação universal com a Lua, o Espelho guarda uma relação direta com o simbolismo aquático, mas dele se diferencia por refletir a luz do fogo elementar. Agora, o importante é que se entenda que quando se fala do simbolismo do Espelho não se trata apenas da mitológica ilusão de Narciso ou ainda da fútil vaidade feminina, mas também da contemplação mística à luz de um limbo transcendente.

    Mas se o Espelho serve para que as donzelas e cortesãs reforcem seus egos e para que os sábios místicos se desvencilhem dos seus, ele também é uma poderosa arma de guerra, utilizada para atear fogo gerar à distância através de raios luminosos, como no célebre episódio atribuído a Arquimedes de Siracusa, que com um gigantesco espelho catóptrico incendiava os navios que tentavam invadir a antiga ilha da Sicília.

    De todas as lendas envolvendo espelhos como arma a mais conhecida é, sem sombra de dúvida, a luta de Kadmo contra a Medusa, narrada por Platão no Timeu . Nesta narrativa, o herói vence a terrível górgona, cuja o olhar tem o poder de transformar seus oponentes em pedra, com a ajuda de um espelho preso ao seu escudo. Kadmo fez com que a Medusa visualizasse sua própria imagem refletida no espelho e tivesse o mesmo destino de suas vítimas, petrificando-se para sempre. Ou seja, o espelho é uma arma capaz de fazer com que o outro se reconheça, com que o adversário tome consciência de si e de suas projeções. O mal reconhecendo a si mesmo como tal, perde toda a sua eficácia e sucumbe a sua própria consciência.

    Talvez por isso, em seu livro De Natura Deorum, Cícero lembra que o Espelho é uma invenção de Esculápio, o deus da medicina; e os antigos sacerdotes nahuas do México costumavam levar um espelho pendurado no peito para que os “demais (homens) descobrissem seu verdadeiro rosto e ser corrigissem”. Pena que este expediente simbólico não tenha funcionado com os conquistadores espanhóis. Estes, aliás, realizaram boa parte da conquista das Américas a custa da sedução de miçangas e dos espelhos, presenteando-os aos indígenas, para que enquanto eles se distraíssem com seus reflexos, não percebessem o que se tramava às suas costas. Caberia ainda lembrar que a sobreposição de temas aparentemente contrários fez do Símbolo do Espelho uma metáfora do paradigma epistemológico pré-científico e, posteriormente, devido a sua reflexibilidade passiva frente ao pensamento consciente, o Espelho passou a ser comparado com o próprio inconsciente - como detalhamos a seguir sobre as relações do dispositivo especular com as ciências humanas.


A Porta do Inconsciente.

    ‘Espelho, espelho meu, existe algum intelectual mais sabido do que eu?’ Num primeiro nível, a reflexão sobre o espelho sempre será um questionamento do ego sobre si mesmo. Mas o espelho nunca responde, ou melhor, nunca discorda, ao contrário, seu silêncio eternamente cúmplice se faz íntimo das mais desmesuradas comparações.

    Entretanto, é este primeiro momento de reflexão, embora sempre reafirme a identidade, que revela a objetividade do subjetivo, pois permite que o observador se observe, imaginando como será visto pelos outros. E desta reflexão primeira da consciênca é que (re)surgem as grandes idéias e os grandes empreendimentos. “Realidade ou alucinação, os mundos ordenados com estes instrumentos de precisão revelam a reversibilidade de todas as coisas: a certeza do aparente, a incerteza do existente.” Aqui o Espelho é comparada a um grande lago de águas límpidas e cristalinas, como um campo projetivo da experiência humana, onde o homem pensa e repensa sua identidade.

    Rompendo com esta primeira perspectiva estética, o tema de entrar através do Espelho em um mundo imaginário, presente, por exemplo, em Alice de Lewis Carroll, tornou-se lugar comum na atualidade, principalmente em Vídeo-Clips de bandas de rock e filmes de ficção cientifíca. Interessante é observar que este ‘mergulho no inconsciente’ sempre parece demarcar os limites a realidade virtual e a vida cotidiana, para a qual o protagonista sempre volta ao final da narrativa. É uma fuga do ego para fantasia e seu invariável retorno. Em muitos casos, o tema do espelho se confunde com o símbolo do Sósia, do Outro, do Duplo. (8)


É como se contemplar no espelho:
A forma e o reflexo se observam.
Tu não és o reflexo,
Mas, o reflexo és tú.
      
O reflexo, no entanto, não é apenas uma sombra: em algumas narrativas, o duplo se rebela contra sua matriz; em outras, o Sósia se liberta de uma dimensão paralela existente através do Espelho. Em todas podemos observar a idéia de porta dimensional e em boa parte a idéia da imagem refletida, do duplo como um veículo do Eu para viagens imaginárias, um ‘corpo astral ou sonhador’. Mesmo nas estórias onde o Sósia se rebela contra o protagonista e adquire vontade própria, existe esta relação, pois o Outro se revolta contra sua função original que é a de representar a forma no mundo dos reflexos, de duplicar o ego em uma imagem que possibilita o autoconhecimento. Porém, os espelhos guardam ainda um sentido mais profundo.

    Entre os tibetanos, a Sabedoria do Grande Espelho ensina o segredo supremo: que o mundo das formas que ali se reflete não é mais que um aspecto do sunyata, da vacuidade. Patanjali (9) chamou esse conhecimento de ‘fluxo imóvel’ e não são raros relatos semelhantes dos místicos de diferentes tradições. Para eles, o Espelho é símbolo da transcendência temporal, da a-historicidade, da superação da continuidade da percepção sensorial pelos lampejos da eternidade.

    Poderíamos, então, concluir que os mitos do Espelho simbolizam a própria representação, não se constituindo ou representando um único arquétipo, mas a própria noção de ‘inconsciente coletivo’ ou de unidade fundamental da experiência simbólica. Representando a própria representação, os espelhos são símbolos da realidade simbólica, são, assim, imagem paradigmática ou um dispositivo complexo, cuja a ambivalência expressa sempre um paradoxo: verdade absoluta e ilusão passageira, beleza superficial e profunda sabedoria, arma e remédio, alienação social e reintegração psíquica, etc.

    Mas se vemos no Espelho este emblema de alma coletiva, ou pelo menos, se encontramos nele um símbolo da cultura ou a metáfora mais abstrata e paradigmática da linguagem, podemos comparar seus reflexos sintagmáticos aos arquétipos, pois enquanto o dispositivo especular enfatiza a diferença, seus espectros sempre reafirmam a identidade simbólica. Em si, os reflexos nunca são ambivalentes, eles são apenas imagens duplicadas. Já o Espelho não é uma simples estrutura duplicadora porque contextualiza e até transforma a realidade, uma vez que remete o observador a uma contemplação do conjunto da representação.

    Enquanto os reflexos nos encantam e nos enganam como identidades arquetípicas, o Espelho representa a consciência de que essas identidades são passageiras e parciais. O Espelho é um convite à eternidade, como, aliás, sugerem as muitas lendas que o associam à longitividade e à manutenção da beleza por meios sobrenaturais, das quais O Retrato de Dorian Gray  é certamente a mais conhecida.

    Muito ainda poderia ser dito sobre os espelhos e sua vastíssima simbologia, porém já reunimos os elementos necessários a análise da lenda nagô a que nos propomos inicialmente. Voltemos agora, portanto, ao mito do Espelho de Oxum.


No Universo dos deuses nagôs

    A narrativa começa dizendo que Oxalá, ‘em um tempo imemoriável’, delegara o governo da terra e dos deuses a Xangô, se comportando como um ‘deus oticius’ ou uraniano, que cria o mundo e o entrega à administração de um de seus filhos, deuses menores. Por uma feliz coincidência, este conceito de ‘Deus-pai’ existente ‘para além dos céus’ foi estabelecido por Mircea Eliade justamente estudando a cultura Iorubá, onde Olorum se retira entregando todo poder a Obatalá.

    O início da narrativa expressa, portanto, um duplicação do mito cosmológico. Trata-se de um ‘tempo imemorial’, mas não de um tempo ‘primordial’. Poderiamos, fazendo uma analogia grosseira entre as mitologias grega e nagô, dizer que se Olorum corresponde a Urano, Obatalá/Oxalá, apesar de seu papel eminentemente solar na lenda analisada, seria a versão africana de Cronos/Saturno, e ainda que Xangô, terceira geração divina a ocupar o poder, corresponderia a Zeus/Júpiter.

    Aliás, como já falamos de passagem, não são poucos e pequenos os elementos simbólicos comuns entre Xangô e o rei dos deuses gregos e romanos, pois ambos têm machados sagrados, lançam raios do alto de suas montanhas, representam o arquétipo da Justiça e, sobretudo, têm múltiplas relações amorosas hierogâmicas com diversas deusas que representam diferentes aspectos da Natureza, sempre feminina.

    Em nossa estória, temos uma luta, não entre duas mulheres, mas entre dois destes aspectos femininos da natureza: Yansã, Rainha dos Raios, dos Ventos e das Tempestades, senhora dos eguns e do mundo dos mortos; e Oxum, Mãe das Águas Doces e senhora do jogo de adivinhação do Ifá. Oxum também é uma deusa do amor e da beleza, uma ‘Afrodite nagô’.

     Os temperamentos das deusas são bastante opostos. Oxum exemplifica a mulher aparentemente submissa e dócil, mas, na verdade, sedutora e dissimulada. Yansã, ao contrário, encarna o ideal de uma mulher independente e sincera, mas de gênio irascível. É também a orixá feminina que tem mais relacionamentos amorosos com outros deuses, característica que, no entanto, não a fez menos ciumenta e possessiva. A Senhora das Águas nada podia contra a força dos ventos. Oxum não poderia se valer de suas armas habituais, a sedução e a mentira, mas para  invocar o poder solar de Oxalá (o self), ela teve que  transcender sua condição narcista e reflexiva. A superação desta vaidade inicial do espelho é que permite a Oxum usá-lo como uma arma real e não como um ‘instrumento psicanalítico’ feito o herói Kadmo diante da medusa. E este é um ponto chave desta lenda: apenas com a ajuda do elemento Fogo, a Mãe das Águas se torna também a Senhora do Espelho e vence Yansã. E assim conquista definitivamente a preferência de Xangô.

    Pode-se também pensar o embate das duas deusas como uma luta entre um feminista militante contra uma dondoca. Mas essa forma de pôr as coisas não nos ajudará a entender o desfecho da lenda senão como uma advertência moralista de que o comportamento feminino mais adequado seja o da submissão dissimulada e não o da liberdade, autonomia e igualdade frente ao masculino. Entretanto, esta leitura é equivocada.

    A mitologia nagô é amoral e não está preocupada em ditar modelos morais de comportamento. Na verdade, a vitória de Oxum tem dois significados para os Iorubás: representa, primeiro, do ponto de vista da agricultura, a preferência pelas chuvas moderadas atribuídas a Oxum como Orixá da Fertilidade do que pelas tempestades simbolizadas pelo casamento de Xangô com Yansã. E, no plano religioso, a vitória de Oxum representa a superioridade da atividade divinatória simbolizada pelo espelho (inconsciente coletivo) sobre a necromancia e o culto aos antepassados, representado pelo aspecto ctônico e intempestivo da Rainha dos Raios.

    Mas esta tendência ocidental em ver uma espécie de ‘Eva’ em Oxum e uma ‘Lilith’ em Yansã tem uma razão de ser. Deixemos por hora esta questão e voltemos mais um vez ao tema do espelho, procurando agora observar como a lenda de Oxum é decisiva para sua compreensão.


A Caverna de Platão

    De todas alegorias ou metáforas envolvendo o tema do espelho, a de maior significação epistemológica certamente é a da imagem paradigmática da Caverna descrita por Platão (11):

Acorrentados de costas para a luz em um cárcere subterrâneo, os prisioneiros só podem ver, dos homens, animais e figuras que passam pelo exterior, as sombras projetadas no fundo da Caverna. Quando um dos prisioneiros se liberta e retorna ao mundo exterior, é cego pela luminosidade do Sol e só aos poucos consegue se adaptar à nova realidade. Percebe, então, que o mundo no qual vivia era irreal e inconsciente, feita de sombras e reflexos das coisas. Porém, o prisioneiro correria sério risco de vida se, retornando ao interior da caverna, procurasse revelar aos seus antigos companheiros a irrealidade do mundo em que se encontram. Provavelmente, eles o matariam.
    
Nesta imagem genial, Platão não apenas resumiu sua concepção sobre a realidade e a linguagem, mas também nos trasmitiu sua experiência pessoal, mais precisamente, sua explicação filosófica para o trágico destino de seu mestre, Sócrates, forçado a beber veneno pelas autoridades atenienses em virtude de sua defesa intransigente de uma visão mais objetiva da realidade. E não foi o único. Giordano Bruno geralmente costuma encabeçar a longa lista dos mártires da ciência e do pensamento objetivo vitimados pela ignorância dos homens escravizados pelas representações subjetivas da realidade.

    Entretanto, o desenvolvimento do pensamento científico não foi, como nos faz pensar o senso-comum, um gradual acumular de informações, mas, ao contrário, uma série de reviravoltas metodológicas, com sucessivas trocas de modelo. O próprio conceito de paradigma - ‘conjunto de estruturas cognitivas e epistemológicas’ - surgiu de uma longa discussão metodológica em torno das revoluções científicas (12).

    Hoje, no entanto, vivemos um momento em que a racionalidade científica e sua visão objetiva do universo destroçaram a maioria das ilusões ideológicas das representações subjetivas. Poderíamos dizer, utilizando a imagem de Platão, que todos os homens se libertaram da caverna e do seu espelho, e que agora desprezam as imagens fantasmagóricas a que estavam acostumados no cativeiro. Neste novo contexto, as sombras tornaram-se símbolos do inconsciente - a que os ‘homens racionais’ negam, mas que voltam em seus sonhos e nas reflexões involuntárias de sua imaginação. Movidos pelo auto-conhecimento, os homens que atualmente decidem ‘voltar à caverna e ao seu velho espelho’  são considerados loucos ou excêntricos.  Não se trata mais de conhecer a objetividade, mas de observar o desenvolvimento da consciência inter-subjetiva, de entender sua linguagem.

    Assim, por exemplo, no paradigma científico da astronomia, sabemos que a Terra gira em torno do Sol; no entanto, continuamos dependendo simbolicamente do paradigma subjetivo da astrologia, que como uma linguagem do inconsciente, condiciona atitudes e comportamentos. Aliás, ao contrário do que pensam os historiadores da ciência, o sistema geocêntrico não significa que Ptolomeu acreditasse que o Sol girasse em torno da Terra, mas sim que ele colocava a questão da representação objetiva do universo em um segundo plano diante da idéia de decifração do destino através da observação especular das estrelas.

    A tarefa metodológica que nos é contemporânea é estabelecer um terceiro paradigma de representação que concilie a objetividade científica com a função simbólica da linguagem desenvolvida pelo hemisfério esquerdo do celebro, que integre nosso conhecimento astronômico em uma nova simbologia astrológica, que relacione o espelho no fundo da caverna ao sol e ao mundo exterior.

    Os ocultistas modernos estudiosos da Cabala hebraica (13) têm uma curiosa teoria a respeito de Deus, do Homem e da Mulher. Para eles, o fato do Homem ser a imagem e semelhança de Deus implica em que ambos jamais possam se ver frente a frente. Mas a mulher, devido ao fato de ter seu sistema neurológico invertido em relação ao masculino destro, pode ver Deus face a face. De acordo com este preceito, os homens nos rituais de magia e cerimônias religiosas deveriam se manter sempre de costas para o altar e de frente para participantes femininas - o que de fato acontece em diversas religiões.

    Nesta proposição, enquanto o Homem é a imagem e semelhança de Deus, a Mulher é seu inverso simétrico, seu espelho. Assim, o Homem só pode ver a Deus através da mulher e Deus necessita dela para dar luz ao seu filho. Esta posição de ‘reflexo primordial’, de mediação entre o Criador e a criatura também tem um caráter universal entre as diversas deusas que representam a grande mãe cósmica. Assim, se ‘o universo é um sonho de Brahma’, se ‘o mundo foi criado para que Deus se reflita nele e conheça a Si próprio’, este espelho, segundo momento cosmogômico de muitas mitologias é sempre um elemento ‘feminino’.

    Neste sentido geral e estritamente simbólico é que podemos associar Oxum à Eva e ao arquétipo feminino genuíno, enquanto Yansã, de costas para o sol, corresponderia ao arquétipo do feminino masculinizado. O significado central da narrativa está no fato de Oxum, devido à situação de perigo iminente, transcender a sua condição de mulher-objeto e se associar ao Sol, de abandonar o uso reflexivo tradicional de seu espelho e utilizá-lo de uma forma tecnológica, racional, solar; como uma arma laser.  A lenda, desta maneira, representa a união cognitiva entre os hemisférios celebrais e a integração epistemológica dos paradigmas.

    No Espelho, encontramos a interseção de duas formas de viver e de pensar o tempo: o transcorrer gradativo dos acontecimentos registrados pela memória e o eterno presente do mundo virtualizado das idéias. Ou, como dizia Santo Agostinho, “a memória das coisas dos homens e a memória das coisas de Deus”.

ESPELHO OBJETO
ESPELHO SÍMBOLO
Tempo Linear e contínuo
Tempo Circular e simultâneo
Passado + presente = História
Presente + futuro = Virtual
Signo = consciência social (Durkheim) + inconsciente individual (Freud)
Símbolo = inconsciente coletivo (Jung) + consciência individual (Hegel)
     
Chegamos ao final. Resta apenas a lembrança àqueles que não se reconheceram neste texto, que por mais que procurem um outro duplo com o qual se identifiquem, sempre encontrarão o sentimento de incompletude tão próprios dos espelhos e da instantaneidade dos seus múltiplos reflexos - dada à vastidão e à complexidade deste tema permanente. Ou eterno?










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